Não se avexe não quem vive nas megalópoles brasileiras, você não está sozinho em suas angústias. Estudo mostra que 2 em cada 10 paulistanos sofrem com a ansiedade, ou seja, sentem medo por algo que não sabem identificar. O sintoma fisiológico mais frequente dessa desordem mental é a resposta luta-fuga do estresse: pupilas dilatam, sangue vai para os músculos esqueléticos, coração dispara... enfim, todas as reações que a meditação - cerne da prática ioguica - influi inversamente.
Não é coincidência, portanto, que o relaxamento, advindo das práticas rituais ioguicas, tenham adquirido status de espiritual, e o estresse o equivalente contemporâneo dos klesas ou os "venenos" que "intoxicam" os corpos (físico e "sutis"): ignorância, apego, aversão, medo da morte e egoísmo. A prática de ioga visa "desintoxicar e purificar" por meio de posturas, respiratórios, mantras e mais uma infinidade de repertórios. O vegetarianismo, o veganismo e a alimentação prânica (viver de luz/prana) está ligado estritamente a essa perspectiva de limpeza transfisiológica.
Em suma, o sistema de crenças do ioga vem se reformando e sincretizando-se no contato com a cultura brasileira. Daimistas cantam mantras, pais-de-santo praticam 108 suryas antes das giras, católicos e evangélicos começam a demonizar as divindades e práticas ioguicas, além de iogues que já associam Shiva com Exú e Brahman com Oxalá. Tudo é permitido na antropofagia brasileira.
A ansiedade de quem vive nos grandes centros urbanos brasileiros vem produzindo novas narrativas religiosas e o ioga integra esse contexto biopsicossociocultural. Samsara por exemplo - o mundo produtor dos klesas em última instância, e a quem a "iluminação" do ioga visa findar (ou iluminar) - para os iogues brasileiros é a própria megalópole que vivem. O êxodo urbano de iogues para o interior ou uma casa mais "ecológica" reflete essa ansiedade e o ioga seu "novo estilo de vida". Assim como o Protestantismo se aliou muito bem ao "espírito do capitalismo" (leia M.Weber), o Ioga visa responder aos anseios (ou tenta) de uma camada da população urbana posmoderna, favorecida economicamente e desencantada com as suas antigas instituições religiosas (Cristianismo, Islamismo e Judaísmo) a uma alternativa ao estilo de vida produzido por esse sistema cultural.
É lícito pensar no Ioga (e demais "novas espiritualidades" que surgem com as terapêuticas hippies - antigas "alternativas") como um complexo sistema cultural (leiam C.Geertz em seu capítulo Religião como sistema cultural) em processo ainda que, consciente ou inconscientemente, busca responder aos "efeitos nefastos do capitalismo de consumo" (entre aspas, pois é o consenso entre o microuniverso ioguico) de indivíduos jovens (20-35 anos) que sonham (e sem ironia ou sarcasmo) com um mundo melhor; utópico, mas ainda assim necessário nutrir essa esperança, pois são dos sonhos que nascem melhores - ao menos diferentes do que a que está em vigência - realidades.